Débora
Oliveira
Giselle
Freire
Ianny
Felinto
Rafaele
dos Anjos
Raquel
Queiroz
O filme “O Leitor” (The Reader) lançando
no ano de 2008 é uma adaptação para o cinema do livro homônimo de Bernhard Schlink, com direção de Stephen
Daldry – cujo currículo conta com nada menos do que os premiados Billy Elliot e
As Horas – traz no elenco uma primorosa e amadurecida Kate Winslet (Hanna
Schmitz), Ralph Fiennes (Michael Berg adulto), David Kross (Michael Berg jovem)
e Bruno Ganz (Professor Rohl), personagens principais e pelos quais tentaremos abordar
a Ética.
Com uma interpretação rica em
sutilezas e digna do Oscar e do Globo de Ouro pela sua atuação, Kate Winslet dá
vida a personagem Hanna Schmitz,
apresentada como uma mulher madura que ocupa os seus dias conferindo cartões de
passagem como funcionária de um transporte local. Mas um evento acaba por lhe tirar
da esfera mecânica e repetitiva a que estava habituada pela entrada em sua vida
do jovem Michael Berg (com metade de sua idade) a quem presta socorro em uma
tarde chuvosa, em agradecimento Michael a procura, mas acaba sendo assediado
por esta. Resultando assim desse
encontro um tórrido romance de verão na Alemanha durante o pós-segunda
guerra.
A relação dos amantes acaba por preencher de
prazer o vazio existencial de suas vidas, seja pela descoberta do sexo por ele
ou pelas sessões de leitura por ela, condição
imposta onde as historias lidas pelo jovem rapaz, a quem carinhosamente chama
“garoto” vêm em primeiro lugar. A aventura vai tomando lugar na vida de ambos até
chegar ao fim quando Hanna compreende que precisa permitir ao garoto viver sua juventude, porém, será tarde
demais, estará marcado pelo resto de sua vida por essa paixão, jamais superando
a essa historia vivida em segredo.
O filme poderia terminar por aqui,
levantando discussões acerca da ética e da moral centrada na relação proibida,
proibição esta estabelecida socialmente pelos códigos de ética e de conduta
moral da época. Hanna em nenhum momento coloca em questão se o que esta fazendo
é certo ou errado, fazendo com que o
espectador indague se esta usando do sexo em beneficio de seus próprios
interesses, ou se é real o sentimento, o fato é que o relacionamento se
constrói nessa troca.
Na segunda fase do filme acontece o
reencontro do garoto com Hanna alguns anos depois, este agora estudante de
Direito se depara com a amante de outrora ao acompanhar um julgamento referente
ao Holocausto no qual Hanna era a ré juntamente com outras ex-oficiais.
Acusadas pelo assassinato de centenas de mulheres judias nos campos de
concentração, pois exerciam o cargo de guardas e permitiram a morte destas, primeiro
por escolherem quem deveria ou não permanecer nos campos ou serem enviadas as
câmaras de gás, na percepção da personagem não havia outra possibilidade, a não
ser escolher as presas que seriam mandadas a morte, mesmo que dentro desta
função buscasse estabelecer critérios escolhendo aquelas mais debilitadas e
idosas a quem a morte já estava anunciada. Segundo, por terem deixado as presas
morrerem em massa num incêndio ao se recusarem a soltá-las.
Interessante ressaltar como o filme
traz a tona uma série de questões que envolvem os códigos de conduta humana,
dos valores e crenças morais e que se inserem num modo de pensar e
relacionar-se delimitado num dado momento histórico e compartilhado socioculturalmente.
Portanto, aborda o campo da ética, a qual se debruça sobre a reflexão de tais
códigos e conjuntos de valores, tradições e costumes humanos. Ao tratar,
portanto, o acontecimento histórico e polêmico que envolve o Holocausto, o
filme suscita a discussão acerca de duas ordens, da moral e do legal, ambas
apresentando distinção entre si, mas que estão imbricadas: as regras e leis
estabelecidas seguindo os valores morais – tal relação se faz necessário para
que tais leis não entrem em choque com os costumes de dada sociedade.
Tal
temática que envolve a trama do filme - a contraposição entre o moral e o legal
- não é nada recente na literatura ou no pensamento humano, sendo abordada por
Sófocles em aproximadamente 442 a.C. em sua célebre tragédia grega intitulada
“Antígona”, personagem do mito que ao desejar sepultar o corpo de Polinice, seu
irmão, indo de encontro às ordens do Rei, paga com sua vida o preço de não
seguir a lei estabelecida Por Creonte. Em “O Leitor”, porém, acontece o
contrário com a personagem Hanna, que na verdade exerce o papel de bode
expiatório dos milhares de soldados alemães que participaram do massacre de
judeus e outros grupos politicamente
indesejados pelo regime nazista. Interessante, como
tratado no final, que havia milhares de campos de extermínio nazista na Europa,
mas apenas aquelas seis mulheres estavam sendo julgadas (e poucos soldados, na
vida real, foram condenados) tendo em visto a escrita e publicação de um livro
de uma judia que havia sofrido juntamente com sua mãe em um desses campos e participado da “Marcha da morte”.
Tal
assunto é suscitado na cena descrita abaixo (uma das mais importantes do filme)
na qual o professor Rohl ao
discutir um seminário que passou aos alunos de direito (incluindo Michael) tem
como pano de fundo de tal trabalho justamente o julgamento dessas seis
mulheres.
Rohl– As sociedades pensam que funcionam através de conceitos morais, mas
não. Elas funcionam através de algo que se chama lei. Ninguém é culpado de nada
só porque trabalhou em Auschwitz. 8000 pessoas trabalharam em Auschwitz.
Exatamente 19 foram condenadas e somente 6 por homicídio. Para provar um
homicídio tem que provar o dolo. Esta é a lei. A questão não é se foi errado,
mas se foi dentro da lei. E não das leis atuais. Não. Das leis das leis da
época.
Aluno – Mas isso não é simplista?
Rohl – Oh, sim. A lei é simplista. Por outro lado desconfio de que pessoas
que mataram outras pessoas tem consciência de que é errado.
A seguir, no final da discussão, esse aluno diz que não
ver razão de estarem discutindo aquele julgamento, dizendo: “(...) Seis
mulheres julgadas por causa do livro que foi escrito. E as outras pessoas?
Quantos campos existiam na Europa? (...)” E finaliza deixando a seguinte
indagação: “A questão é: como você pode deixar isto acontecer?”- Essa é uma das
questões cruciais que permeiam acontecimentos como o do Holocausto e que
envolve vários aspectos, mas que não objetivos tratar aqui. Antes de sair o
mesmo estudante diz que havia milhares de campos na Europa e a cena se
finaliza. O que mais impressiona, contudo, não é a revolta do aluno diante da
“impunidade” ou o seu questionamento acerca de como um masacre de atual
dimensão se tornou possível, mas a própra naturalidade da persongam Hanna Schmitz
diante do julgamento.
Para Hanna sua conduta seguia um
código de ética bem estabelecido e era sua obrigação cumpri-lo, sua função era
guardar os presos, e é justamente pelo argumento de outro código de ética
estabelecido pelas normas da lei que esta passa a ser julgada anos depois,
afinal nenhum código é capaz de abarcar a realidade em sua totalidade, posto
que esta é dinâmica, se antes a conduta de Hanna estava amparada agora
tornara-se crime, difícil de ser
compreendido por ela como podemos perceber na sequencia das falas, quando
indagada pelo juiz do porquê de não abrirem a porta durante o incêndio:
Hanna
- Obviamente, pela razão óbvia. Não
podíamos. Éramos guardas. Nossa missão era guardar os prisioneiros. Não
podíamos deixá-los fugir.
Juiz - Entendo. Se
escapassem, seriam culpadas, acusadas, ou até executadas.
Hanna - Não! Se
abríssemos as portas, seria um caos. Como iríamos restaurar a ordem? Aconteceu
rápido. Estava nevando, haviam bombas, haviam chamas, por toda a vila. Então
começaram os gritos. Ficava pior e pior. Todos iriam correr, não podíamos
deixá-los escaparem. Não podíamos. Éramos responsáveis por eles!
Juiz - Então, não sabia
o que estava acontecendo? Não sabia e
fez uma escolha. Deixou todos morrerem,ao invés de arriscar deixá-los escapar.
(O
leitor, 2008, 69´56´´)
Hanna demonstra nessa fala não
renunciar à identidade construída na formatação das representações a si
atribuídas nos jogos de poder, não reflete, e nesse sentido não realiza uma
atitude crítica para consigo. Como explícita Menezes (ano) ao discursar sobre a
apropriação de Kant por Focault na reconstrução da ideia de autonomia enquanto a capacidade de
refletir / pensar sobre as suas próprias ações: “Ser autônomo é traduzir a maioridade do individuo numa atitude crítica
para consigo [...]”(Menezes, 2006, pg.42). Segundo este, Focault fala de um
ethos individual que se estabelece
sobre as condições de análise do presente, configurada no filme pela determinação
do nazismo, e pelo exame crítico através da consciência de pertencimento nas
relações de poder e suas formas de resistência.
Schmitz ao ser verdadeira quanto ao seu envolvimento no
SS (Schutzstaffel ou a organização paramilitar ligada do partido nazista) e nos
eventos tratados no julgamento, mostra-se igualmente verdadeira em relação ao
que significava pra ela deixar as presas saírem do prédio em chamas. Não era o
medo da punição diante de autoridades superiores que a levou a ter essa atitude
permissiva diante do acontecimento, mas uma obediência totalmente passiva. Tentaremos,
desse modo, articular tal postura da personagem com a análise de Figueiredo (1995), o qual
desenvolve uma das possibilidades de aproximação entre Heidegger e Foucalt na
compreensão da ética enquanto morada e habitação.
A ética, neste sentido, estaria
vinculada com a dimensão humana do si-mesmo, tal como pensado por Heidegger
(1999), ou seja, para a dimensão da experiência, que se apresenta ao homem na
sua condição de existência. Dessa forma, essa maneira de ser e estar no mundo
irá se refletir em como vemos essa realidade que nos cerca, o que exige de nós
o compromisso social com esta realidade. Assim, pensa-se o mundo vivido (tanto
o nosso, como o do outro) com o olhar da diversidade, da pluralidade e
complexidade que constituem a natureza humana, mas não esquecendo a
singularidade que caracteriza a condição humana.
Foucault
se remete à crítica empreendida por Heidegger às metafísicas do sujeito ou à
crença num sujeito como fundamento auto-fundante do mundo e das representações
e separa conceitualmente os domínios dos códigos morais e o dos atos ou
condutas - enfatizando este segundo como decisivo para a constituição
das subjetividades. Por outro lado, para este autor, tanto os códigos de
prescrições e proibições como, e principalmente, as relações consigo são
históricas e sujeitas a amplas variações e múltiplas combinações (Figueiredo,
1995, pag. 4).
Dessa
forma, a ética enquanto morada ou habitar, como proposta por Heidegger,
torna-se a figura que metaforiza a dimensão ética da existência em toda a sua
complexidade e eficácia. Ora, se o homem, como ser aí, é arremessado num mundo
que ele não escolheu de maneira que ele existe no sentido preciso de ser fora
de si mesmo, Heidegger irá propor um espaço de separação, de recolhimento, de
proteção que não encerre o existente numa clausura, mas lhe ofereça uma
abertura limitada em que se reduzam os riscos dos maus encontros. (idem, pag. 4).
Assim,
voltando-se para o filme em questão e remetendo-se a dinâmica da personagem,
percebe-se que Hanna não desenvolve a capacidade (pelo menos até o momento de
seu julgamento) de manter e edificar sua própria morada com relativa
independência, não atuando de forma reflexiva, como um sujeito ético que possui
uma relação de si para consigo de certa forma autônoma diante das funções
exercidas por ela e pelos outros. Foucault se refere a tal questão como “ocupar-se
de si”, constituindo uma forma de vida – “não há outro fim nem outro termo além
do propósito de estabelecer-se junto a si, ‘residir em si mesmo’, fazer aí sua
morada” (Figueiredo cita Foucault, 1995, pag. 7).
É
preciso considerar que à Hanna, como ser dasein, são colocados códigos de
prescrições, papéis e proibições enquanto cidadã alemã e membro do exército
nazista (embora ela tenha escolhida entrar em tal organização) de uma ideologia
fascista e desse modo, deve-se considerar também tais relações que lhe são
impostas e desencadeiam uma relação consigo e de morada que está influenciada
por fatores de sua época e sujeitas a amplas variações e múltiplas combinações.
Mas mesmo considerando tais determinações, Foucault parte de uma experiência
radical de desterritorialização e propõem a ordem da estética existencial
(fazer da vida uma obra de arte, sem qualquer procura de uma verdade de si,
como ele sugere ao movimento gay em contraposição a qualquer ciência ou
conhecimento científico da sexualidade (Figueiredo cita Foucault, 1995, p. 9).
Citando
Nietzsche, Figueiredo finaliza a análise do conceito de ética enquanto morada colocando
a noção de “O grande estilo”- capacidade de nos tornarmos senhores do
caos que somos em nós mesmos, sem mutilar as forças em combate,
forçando o caos a tomar forma (Figueiredo cita Ferry, 1995). Assim,
esclarece-se que “Fazer da vida uma obra de arte seria assim
suportar todas as tensões instituídas pela diferança, pelos intervalos,
pelos vestígios, pelas antecipações, pelos diferendos de que somos feitos”.
Interessante ressaltar que mesmo não demonstrando vergonha em assumir seus atos
enquanto guarda na Segunda Guerra, Hanna prefere assumir uma culpa que não era
sua à dizer publicamente que não sabia ler – e esse fato era o que realmente
lhe causava vergonha, pavor. E é aí que se pode aplicar “o grande estilo”,
conforme Nietzsche, de assumir e suportar suas diferenças (não saber ler, não
superar as marcas deixadas pelo trabalho nos campos) e em busca de uma estética
existencial, transformando esses vazios, esse caos em formas que lhe dê sentido
e desse modo, ser capaz de optar por escolhas que, por vezes, vão de encontro
ao que se espera socialmente.
Vendo,
agora, sobre o ponto de vista da ética utilitarista, cujo princípio consiste em
escolher a ação que produz o maior bem-estar agregado ou maior prazer (bem)
e/ou menos sofrimento (mal) para a maioria, a análise da situação experienciada
por Hanna não foi moralmente correta, tendo em vista ser aproximadamente 300
prisioneiras o número de mortas queimadas no templo. Assim, mesmo que as
guardas sofressem punição por deixar que as prisioneiras escapassem seria muito
menor (supondo aqui o cálculo hedônico que consiste no balanço entre prazer e
desprazer) do que a perda de 300 vidas.
Vale
ressaltar, no entanto, que se tal cálculo hedônico fosse realizado levando em
consideração toda a Alemanha nazista ou Terceiro Reich
e se, por exemplo, os nazistas fossem defender a utilização dos prisioneiros
para a evolução dos estudos científicos em prol da humanidade, torna-se difícil
dizer se a utilização dos presos para testes e mesmo em trabalhos compulsivos
para os alemães não seria moralmente correto de acordo com a teoria
utilitarista, visto o “mecanismo” de julgamento de tal embasamento ser de certa
forma simplista, utilizando de cálculos que não de adéquam, em nossa opinião, a
complexidade que envolve o estar no mundo. Até mesmo levando em consideração
que nem sempre preceitos legais estão a favor do bem comum - O Utilitarismo de
regras (em contraposição ao Utilitarismo de Atos, de Bentham) apregoa que: “A
ação moralmente (mais) correta é a que segue uma regra cuja adoção se supõe
produzir o bem maior para a sociedade que adota o sistema de regras a qual ela
pertence.” (Branco, pag. 30). Pensando dessa forma, não seria condenável a ação
dos nazistas visto que se calcava em valores aceitos na sociedade da época.
Vale considerar, no entanto, que mesmo defensores de tal ética, admitem a
limitação dos princípios da ética utilitarista em alguns casos, como nos vários
aspetos que envolveram o holocausto.
Por
último, conhecendo as teorias éticas, tem-se na ética relativista aquela que
mais se assemelha com o que a personagem Hanna acredita, uma vez que se percebe
que ao mesmo tempo que ela carrega o peso de sua dura decisão no passado (em
alguns momentos, como quando ela vai até a igreja onde ocorreu o incêndio e
chora, percebe-se que mesmo não falando no assunto, mais carrega as marcas
deixadas pelo período de guerra) ela no julgamento parece ainda não compreender
que ainda lhe restava a decisão de abrir os portões, mesmo que isso fosse de
encontro ao instituído e é nesse lugar que a personagem permanece – o lugar do
sujeito enquanto operador de ações que são moralmente corretas no momento em
que os padrões de aceitação para o julgamento moral dependem da cultura ou
grupo social inserido. Tal posicionamento tem por princípio que a diversidade
de códigos morais que existe hoje, assim como através da história, indica que
não há uma única moralidade que governe todos os seres humanos. Assim o
relativismo parece eliminar a crítica de qualquer um que esteja fora da minha
própria cultura ou subcultura e por essa razão as dificuldades com o
relativismo estimularam a busca de uma teoria do raciocínio moral que seja
universal.
Assim, podemos analisar que Hanna
deixou-se subjugar pelas relações de poder existentes, e assujeitando-se anula
sua subjetividade. A problematização ética tida enquanto atitude de modernidade,
ou seja, enquanto modo de se relacionar com a atualidade, compreende a esfera
da subjetividade /singularidade do sujeito, e sua constituição histórica. Nesse
âmbito sua forma de conduta deveria ser pautada por uma estética da existência
“[...] atitude do
sujeito histórico de tomar a si mesmo como objeto de elaboração de si próprio
enquanto uma pratica refletida da liberdade, nos limites do seu próprio
contexto ou do horizonte de experimentação do individuo no campo atual das
experiências possíveis” (Menezes, 2006, pg.44)
Conduta que podemos vislumbrar em
sua atitude de escolher os mais incapacitados para a morte, isto era no momento
o possível a ser feito, no entanto, não mantém a mesma congruência ao não
compreender após tantos anos as outras possibilidades que não a chacina
ocasionada pelo incêndio. Afinal, entende-se a compreensão ética como o “princípio
de uma critica e de uma criação permanente de nós mesmos na nossa autonomia” (FOUCAULT,
1994, pg 687 apud MENEZES, 2006, pg.44).
Ainda
discorrendo acerca de tal compreensão de ética, o texto traz “[...] a ética do
individuo corresponde à conduta do fazer-se objeto de si mesmo no âmbito de
produção da autonomia enquanto construção da própria vida.” (Menezes, 2006, pg.45)
criando sua própria existência no contexto das relações de poder, “reinvenção
constante do modo de ser, como criação de uma forma singular de vida,
estruturada a partir da reflexão critica da conjuntura, experimentada no nível
das praticas e condutas, enquanto modo possível no contexto histórico-social”(Menezes,
2006, pg.46)
Hanna acaba sendo condenada - a
única condenada à prisão perpétua - pela autoria do crime, pois foi alegado que
um documento descrevendo os acontecimentos e decisões relativas ao dia do
incêndio teria sido escrito por Hanna, no entanto (para quem ainda não havia
captado acontece aqui a grande revelação) esta era analfabeta, jamais poderia
ter escrito tal documento, informação que poderia mudar o veredicto do juiz,
mas que foi subtraída pelos únicos que detinham essa informação, Hanna e Michael.
Hanna esconde seu analfabetismo por orgulho ou vergonha e o Garoto sente-se
impotente, pois respeita sua decisão de esconder, convencido pela exposição do
professor Rohl “ – O que sentimos não é
importante. É totalmente irrelevante. A questão é o que fazemos.” (O leitor,
2008, 75´05´´) Colocando em evidencia assim a ética deontológica em
detrimento de uma ética da virtude
Após
cumprir muitos anos de sua pena, Michael resolve estabelecer contato com Hanna
enviando a gravação de fitas em que lê livros. Hanna, já debilitada pela idade
então renasce para vida e pela primeira vez busca uma mudança, aprender a ler. Portanto
no fim de sua vida mantém uma postura ética, segundo Foucault disposta a mudar
a si e seu pensamentos e sem temer as mudanças, liberta-se
“Na ontologia critica
do presente, mais que cuidar de si a vocação é se ultrapassar. Temos que nos
recusar a ser o que somos, não podemos aceitar o que foi feito de nós, vamos
nos inventar e fazer da nossa vida uma existência livre e bela, esse é o lema
do último Foucault”( Branco, 2006, pg. 56)
Com sua morte, Michael resolve
também libertar-se do passado, começando por compartilhar com a filha o segredo
a tanto tempo guardado, afinal, segundo Foucault, é apenas pelo diagnostico do
presente que podemos traçar perspectivas de futuro, transformando a historia.
REFERÊNCIAS
Branco, G. C. (2006). Atualidade e Liberdade em Michel
Foucault. In: A. B. Menezes, Ética , Bioética: diálogos interdisciplinares.
Natal: EDUFRN.
Costa, C. F. (2006). Razões para o utilitarismo: uma
avaliação comparativa dos pontos de vista éticos. In: A. B. Menezes, Ética , Bioética: diálogos interdisciplinares.
Natal: EDUFRN.
Figueiredo,
L. C. (1995). Foucault e Heidegger: a
ética e as formas históricas do habitar (e do não habitar). Tempo social; Rev.
sociol. USP, São Paulo, 7(1-2), 136-149.
Furrow, D. (2007). Ética: conceitos-chave em
filosofia. Trad. Fernando José R. da Rocha. Porto Alegre: Artmed, PP. 44-49.
Menezes, A. B. (2006). Ética e
modernidade: a dimensão da autonomia em Michel Foucault. In: A. B. Menezes, Ética,
Bioética: diálogos interdisciplinares. Natal: EDUFRN.